DUB LOVE – uma subversão do balé clássico
Marjory Leonardo*
Eu nunca tinha visto nada da Compagnie Vlovajob Pru e nem outra coisa do François Chaignaud e da Cecilia Bengolea, mas depois de Dub Love fiquei com vontade de ver mais. Isto porque o espetáculo se mostrou muito interessante com a ideia de desmistificação da formalidade do balé clássico; não que este tema seja uma inovação dentro da dança contemporânea, mas o modo que é feito o tornou especial.
Dub Love trata do corpo clássico desmistificado: três bailarinos em sapatilhas de ponta e collants estão em cena junto a grandes caixas de som e um DJ, que toca a música dub, típica de festas jamaicanas e que influencia a dança dos intérpretes. Sua batida grave e pesada transforma o balé clássico, ereto e leve, numa dança mais densa, curvada, com bastante mobilidade na coluna. Essa movimentação nos remete às danças negras como a dança afro – com muitos movimentos impulsionados pela coluna – ou o hip hop – cultura vindoura dos guetos do Brooklyn que utiliza elementos como a gravidade no corpo para estilizar sua dança.
Dessa maneira, vejamos: o balé preza pelo corpo leve e ereto; é uma dança europeia e branca que se utiliza de música clássica. O que faz a Compagnie Vlovajob Pru ao propor um espetáculo que trabalha com gravidade sobre os corpos, movimentos de danças de origem negra, música popular jamaicana? A subversão. E, se analisarmos bem os espetáculos que compuseram o Panorama 2016, é fácil entender do que trata o festival e suas peças: subversão e questionamento do lugar comum, neste caso, o lugar do balé clássico.
Portanto, a desconstrução do clássico como proposta, elaborada em cima do ritmo jamaicano, pode nos levar, além da apreciação estética da obra, a pensar justamente o lugar da cultura negra na cena contemporânea – e seus desdobramentos sobre a dança clássica. É estabelecido o palco como lugar também para uma cultura popular, das ruas e dos guetos. Isso evidencia, além das quebras de paradigmas pré-estabelecidos pelo colonizador – visto que o balé é uma dança de origem francesa que coloniza o corpo –, a abertura da cena clássica para outras possibilidades de corpos que não os usuais. Assim, a companhia propõe a desconstrução do balé e, com isso, também a reconstrução do olhar do espectador acerca do corpo clássico, pondo em questão a estética clássica e, com isso, demonstrando uma (dentre tantas) das possibilidades da dança contemporânea.
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* Marjory Leonardo é estudante do Bacharelado em Estética e Teoria do Teatro na UNIRIO. Atualmente participa do coletivo ÁRDUO Produções onde pesquisa performance e dança contemporânea. Fez parte da Companhia Híbrida (2007-2016) dirigida por Renato Cruz, que dialoga com as linguagens das danças urbanas, dança contemporânea, performance e teatro.
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Texto produzido no LabCrítica no Festival Panorama 2016.
Foto: © CristianoTrad[/unordered_list]